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Brasil Pedro Pedreira

Durante minha infância e adolescência o programa de televisão Escolinha do Professor Raimundo alegrou noites, tardes e finais de tarde. Chico Anysio, sempre com humor satírico, hilário e, muitas vezes, crítico, liderou uma turma com personagens que representavam a diversidade brasileira e expressavam traços de supostas identidades culturais presentes no povo. A escolinha exaltou a caricatura, em muitos momentos, desinteressada, individualista e irresponsável com o compromisso de aprender. O "jeitinho" ou a malandragem também nortearam o reconhecimento de alguns personagens que eternizaram chavões, por vezes, depreciativos da condição humana.


De todos os personagens, entre eles, Pedro Pedreira sempre pareceu ser questionador dos fatos, aquele que suscitava a contradição pela negação pura ou também estimulava um ceticismo outrora saudável e pertinente. Pessoalmente, enquanto assistia os episódios, pensava como pode negar fatos históricos? Sua performance artística expressava tamanha confiança ao apresentar propostas absurdas e esdrúxulas de (contra)provas para que pudesse então aceitar algo como verdade.

"Não me venha com chorumelas!", era o bordão do personagem Pedro Pedreira. No passado era cômico sua descarada audácia, intransigência e ignorância cega. O que produzia boas risadas, pois a piada e o humor eram o centro da encenação. Hoje, triste percebo que o Pedro Pedreira deixou de ser um traço da representação do brasileiro e passou a ser o modelo aceito na regência das relações políticas, econômicas, sociais e culturais. O cômico da ficção virou tragédia na realidade de um país que transformou a sátira caricatural e festiva em exaltação da barbárie física e intelectual.

Não me venha com chorumelas é o retrato do Brasil contemporâneo, com muitos Pedros Pedreiras sem disposição ao aprendizado e ao debate coletivo. Opulentam certa altivez que se reduz a gritos e ao dedo em riste, expressões do desejo de sempre dar um ponto final as discussões. Apesar de seu ponto de vista envolver uma dada perspectiva de mundo, por mais cômica ou hilariante que possa ser, aparentam uma visão carregada de argumentos que revelam ignorância e maldade em uma sociedade com informações disponíveis de maneira muito facilitada. Os Pedros Pedreiras vendam os olhos e tapam os ouvidos para o óbvio, destilando os seus sensos críticos de forma difusa e deslocada.

Essa é a realidade fatídica de um Brasil Pedro Pedreira que aguarda sempre um não me venha com chorumelas, uma expressão que foi atualizada no "é tudo Mi Mi MI" e no "choro é livre". O Brasil Pedro Pedreira é rancoroso, sisudo e agressivo. Uma nova imagem de um Brasil que aceitou a piada como realidade e a “verdade” como uma piada. Nosso país tem sua nova representação, Pedro Pedreira ganhou o protagonismo assumindo uma marca cada vez mais indelével. Para suportar esse momento, somente parafraseando o personagem, “só enfrenta quem aguenta!”



Versão final do texto com o título "Entre Pedros o Brasil que virou ‘Pedreira’, disponível em: https://pensaraeducacao.com.br/pensaraeducacaoempauta/entre-pedros-o-brasil-que-virou-pedreira/


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